Coerencia
A democracia, já o escrevi por várias vezes, é um regime muito frágil porque alberga no seu seio até os seus piores inimigos.
Para além da intolerância ao livre debate de ideias, à corrupção de todo o género o que mais a desgasta, e por vezes até a mata, é a incoerência daqueles que consigo mais beneficiam tendo a pretensão de que são o seu fundamento, quando na realidade é a democracia que fundamenta e possibilita a sua existência: os políticos e o seus feudos que são os partidos e as Instituições Oficiais que proliferam num estado social de direito.
Não está em causa a existência destas Instituições Oficiais mas daqueles que no lugar de as servirem, no bem da comunidade onde se inserem, se servem delas para proveito e dos seus apaniguados.
Serve tudo isto para me referir ao caso da deputada e vereadora, na Câmara Municipal de Santarém, pelo Partido Comunista Português, Luísa Mesquita.
Em nome de uma “renovação sustentada da bancada” o partido propôs o seu abandono do hemiciclo coisa que a deputada se recusou a fazer.
O partido face a esta posição da sua deputada argumentou com os compromissos que eventualmente foram assumidos por ambas as partes e com os estatutos partidários com os quais Luísa Mesquita havia concordado no momento da sua adesão ao partido.
Pois é exactamente a partir daqui é que as coisas se complicam a nível legal, se o acordo de renúncia entre os deputados e o partido existe, então trata-se, como já anteriormente escrevi, de um acordo de “cavalheiros” que deve ser moralmente respeitado, moralidade que a lei não regulamenta, e mesmo que regulamenta-se, neste caso concreto, teria sempre que o fazer contra o partido uma vez que doutra forma seria inconstitucional e ou não estaria em vigor ou se estivesse caberia sempre recurso junto do Tribunal Constitucional.
O mandato de deputado é pessoal cabendo-lhe a ele e só a ele a decisão de renúncia mesmo que tenha assinado qualquer documento de sentido diverso.
A ninguém se pode impor que assine e respeite documentos que violem direitos constitucionalmente garantidos como é este o caso.
No que toca ao cumprimento ou não dos estatutos do partido, por parte da Luísa Mesquita, é que assenta mais uma incoerência por parte dos dirigentes comunistas que nada abona em seu favor nem do partido a que pertencem:
1º Durante a campanha eleitoral para a Presidência da Republica o candidato oficial do PCP e seu Secretário-geral, Jerónimo de Sousa, defendeu entre outras coisas o cumprimento intransigente da Constituição da Republica Portuguesa em todas as suas vertentes, nomeadamente nos aspectos do Estado Social de Direito nela consagrados, facto que na altura considerei de elementar bom senso uma que a ser eleito Jerónimo de Sousa assumiria na Assembleia da Republica e publicamente perante os portugueses e os seus legítimos representantes o compromisso de cumprir e fazer cumprir a Constituição da Republica Portuguesa.
2º Em vista disto como pode o Partido Comunista Português ter estatutos que podem estar feridos de inconstitucionalidades várias?
Será que o cumprimento dos preceitos Constitucionais é somente para alguns e para apregoar nas campanhas eleitorais e de acordo com as necessidades do momento?
Noutro partido até talvez se pudesse compreender mas o PCP tão zeloso defensor desta Constituição?
Como pode exigir que os seus deputados abdiquem de direitos constitucionalmente garantidos em nome de uma qualquer “renovação sustentada da bancada” e assente em assinaturas de documentos sem qualquer valor jurídico-legal e facilmente impugnáveis?
Como podem os comunistas portugueses apregoar uma coerência na prática politica diária, com exemplos destes que os seus dirigentes nos dão, sabendo que a doutrina oficial é a do “centralismo democrático” onde não existem facções, com alguém escreve neste blogue, e portanto o exemplo vem de cima?
Em 2009 iremos para eleições autárquicas e é com atitudes persecutórias destas que se vão apresentar ao eleitorado em Alpiarça e constituir-se como real e credível alternativa ao poder socialista?
Quem garante aos eleitores alpiarcenses de que em nome de uma “renovação
Sustentada” quer do Executivo Municipal ou da bancada na Assembleia Municipal não vêem as pessoas que elegeram para aqueles órgãos serem substituídas por outras mais convenientes à estratégia do partido?
Mas que importância têm estas questões se na realidade as pessoas não contam mas apenas os projectos que o partido tem para elas?
Será que as pessoas, os eleitores alpiarcenses neste caso, irão concordar com esta forma de ver as coisas?
O caso da deputada Luísa Mesquita deve ser muito bem analisado e ponderadas as consequências que poderão resultar para o partido uma sua eventual expulsão, que apenas desacreditará o PCP e os seus dirigentes, e que em nada mudará o estatuto político da personalidade em causa.
O PCP deveria analisar bem a estratégia empreendida pelo Presidente da Câmara Municipal da Chamusca, e que lhe valeu uma robusta vitoria eleitoral, quando tudo parecia perdido.
Os dirigentes comunistas devem entender que ainda vivemos em democracia e o que diverge este regime das ditaduras é que em democracia quando o povo não concorda nem com os governos nem com os partidos políticos muda os primeiros e não vota nos segundos, ao passo que em ditadura quando o povo não concorda nem com os governos nem com os partidos que lhe dão suporte estes mudam o povo.
Não creio que o povo alpiarcense queira ser substituído e por isso deve penalizar, quase tenho a certeza disso, na próxima ida as urnas.